quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Rotina


Todo dia de manhã a mesma coisa: gosta de acordar devagar, por partes. O despertador toca a primeira vez, ele desliga. Mais quinze minutos de sono. Toca de novo, ele, sem nem abrir os olhos, repete o gesto. Estica o braço, aperta o touch e faz o aparelho parar. Dessa vez são dez minutos sagrados. Daquele acorda não acorda. Queria continuar dormindo, mas preciso acordar. Na terceira vez em que o celular toca, a raiva e a impaciência com aquele barulho que lhe tira o sono, literalmente, atinge o ápice. Dá-se por vencido e abre os olhos de vez. 

Com calma, tira os cobertores de cima do corpo, senta-se na cama, liga a luminária. Estranhamente sente a boca seca, dá um gole na água. Tem sempre um copo no criado mudo. Lembra-se, então, da irmã e da ex-namorada. Pega de novo o telefone, dá uma olhada na caixa de e-mails e uma passada rápida pelas redes sociais. Gosta de saber o que está acontecendo. Mas, raramente interage com alguém. 

Antes de levantar, nota a garrafa de vinho no chão ao lado da cama. Faz sentido a boca seca. Por um segundo questiona-se se não está bebendo demais, ainda é a terça-feira. Desiste do pensamento. Coloca um pé no chinelo, mas não encontra o outro. Vai até o banheiro, faz xixi e apronta-se para entrar no banho: play no alto falante em cima da bancada e escova de dentes na boca. Dá aquela checada na hora pra saber quanto tempo tem debaixo do chuveiro. 

Enquanto Mick Jagger grita que você não pode ter sempre o que quer, mas que se você tentar algumas vezes você encontra o que precisa. Ele, que nunca foi bom em tomada de decisões, define que não pode mais levar a sua vida com a barriga. Não pode mais continuar vivendo naquele meio termo entre o ser e o não ser, estar e não estar.  

Ao mesmo tempo em que ensaboa a cabeça com aquele resto de shampoo barato, pensa nas alternativas que tem. Quando dá por si, está cantarolando a próxima música e esqueceu dos problemas. É por isso que gosta tanto de tomar banho acompanhado das suas bandas preferidas. A música - sempre disse ele - é o remédio da alma. 

Etapa banho cumprida, troca a das músicas para a rádio de notícias. O jornal da manhã vai começar. À medida que termina de se arrumar, fica sabendo de tudo que acontece pelo mundo. Principalmente o trânsito e no esporte. Adora o jeito como aquela repórter termina suas matérias, sempre imita a sua assinatura, o modo como divide a terceira e a quarta sílaba do seu sobrenome. Abre um sorriso. Bebe o café em um único gole e corre para a rua. 


**

Abre o portão. Pega o elevador. Aperta o sétimo andar. Agora é a vez da porta. Os ombros pesam. Nada do que tinha planejado aconteceu. Nenhuma daquelas resoluções arquitetadas no banho foram colocadas em práticas. Nem a mais simples delas que era diminuir a quantidade de cigarros. 

Joga a mochila na mesa, se joga no sofá. Tira um sapato, depois o outro. O celular apita. É mensagem daquele amigo pedindo ajuda sobre o encontro de daqui a pouco. Encaminha-se para a cozinha, pega uma cerveja na geladeira. Responde o amigo. Começam a conversar, falar sobre tudo e sobre nada. Abre a segunda e quando chega na terceira o amigo se despede, está saindo de casa. Ele lembra que está sozinho e vira a latinha, como faz com o café, de uma só vez. 

O corpo exausto de mais um dia cansativo pede por cama. No caminho até o quarto ele abre de novo a geladeira. Mais duas cervejas. No outro dia, tudo igual. 

Nenhum comentário: